domingo, 1 de março de 2015

Palacete da Glória tem infiltrações e corre o risco de desabar

Às vezes o mundo inteiro fica borrado, mesmo que meus olhos estejam secos. Sou difícil de chorar, mas sou fácil de sentir. E isso é um problema, porque não demonstrando, eu acumulo tudo e calo. Fico completamente mudo, mas a três passos de transbordar sem volta. E ninguém desconfia. Ninguém suspeita. Por isso é que me pensam forte e esse é o problema. Não sou. Sou todo esfarelado, de coração em pleno craquelê.

Às vezes eu sinto que chorar desfaria meus nós de trás dos olhos, aliviaria a pressão, não sei se no peito ou na alma – caso alma exista. Então eu me esforço, eu vejo filmes tristes, eu ouço músicas melancólicas e quase consigo. Chego muito perto. Consigo até inundar os olhos a ponto deles doerem. Mas no momento final, quando a primeira lágrima estaria prestes a romper a última resistência, eu lembro que é por mim que choro. E então não consigo. Então o meu organismo reabsorve a água e o sal que me exorcizariam de mim. Choro para dentro e isso não vale. É mais acúmulo para minhas enchentes interiores, é mais pressão a uma vazão que não tem força.

Estou assim, sufocado, farto, suicida até. Porque não há mais lugar para nada aqui no peito. E as lágrimas vertem, incessantes, mas só por dentro, infiltradas em cada uma das minhas estruturas, danificando paredes, pinturas e pilastras. A maresia me corrói e estou a quilômetros do mar, a água me inunda e há semanas que não chove, a tristeza me afoga e por fora eu sorrio. Eu ainda sorrio. De quê, meu Deus, de quê?