quinta-feira, 26 de abril de 2012

Carta Aberta

Sim, eu entendo, querida. Entendo que talvez seja confortável deitar-se nas mágoas que enchem essa casa. Entendo que aqui nossos rancores têm estofados macios e encostos reclináveis. Entendo que nossas portas trancadas te garantam a solidão modorrenta de que tu gostas. Mas, por favor, vá embora.

Sei que é bom de beber a amargura que daqui jorra. Sei que é bom de ouvir as portas batendo com força. Sei que é lindo ver as lágrimas marcando as toalhas no banheiro trancado. Mas, por favor, vá embora.

Entendo que não te queiram em nenhum outro lugar também. Entendo que temos de nascença a mesma marca e que isso nos liga de alguma forma. Entendo que eu já tenha deitado na mesma cama que tu e te seduzido tantas vezes mais. Mas, por favor, vá embora.

Eu cansei de te encontrar espiando nos espelhos. Cansei de te ver com os meus no colo. Cansei de esperar para ver qual será teu próximo movimento, a próxima peça roubada. Sim, eu continuo te amando de um jeito solene e tosco. Continuo te admirando o rosto negro e os lábios grossos. Continuo a sussurrar teu nome nos momentos piores. Mesmo assim, vá embora, eu imploro.

Porque não sei, Morte querida, se poderemos continuar os dois aqui, nessa mesma casa.

Do mesmo assim sempre teu,
Vinícius

2 comentários:

  1. Realmente,Vini você não precisa do título de escritor porque você é um leitor de almas e de dores.
    Também conheço essa querida de perto.
    Li com as lágrimas escorrendo.
    Beijo.

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  2. Se um dos dois tem que partir, e "eu" ainda não posso.

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