quinta-feira, 29 de julho de 2010

Silêncio

E-mails não lidos.
Comentários não respondidos.
O blog não atualizado.

Eu tenho o que dizer. Mas já hoje tudo me sufoca.
E eu, que nunca fui claustrófobo, preciso de espaço.
E nesse espaço eu quero silêncio.
Só.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Felicidade (des)esperada

Sozinho sentado no muro, vendo a tarde cair e os sonhos desabarem.

Queria que você agora chegasse, com guizos nos pulsos e o rosto pintado. Dançando sem música e cantando sem ritmo, sorrindo bastante e me puxando nos braços.

Queria te ver enrolada em fitas coloridas, cabelos trançados e lábios em cintilante coração. Queria que você me dissesse em cantares que a vida é bonita e a saída que busco está num sorriso.

Queria que você me aninhasse, me deixasse chorar até escorrer toda mágoa que tenho por dentro, sem perguntar o porquê. Queria que secasse minhas lágrimas num lenço enfeitado que se transformasse em pássaro alado só para fazer eu sorrir.

Queria que abrisses uma sombrinha colorida, donde pulariam confetes que “molhariam” nós dois. Queria te ver fazendo mágicas bobas e boas de flores que aparecem sem eu entender. Então assim, debaixo das bergamoteiras, eu seria menos triste. Então assim, pisando as pedrinhas, eu estaria menos sozinho. Então assim, levemente extasiado, eu poderia voltar a viver.

Mas você não vem.

E eu estou sozinho, esperando, ridículo, sentado no muro, vendo a tarde cair e sem saber como ajuntar os sonhos todos desabados.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Era uma casa muito engraçada...

Mudou-se de casa por causa dos ratos
mas os ratos arteiros, matreiros que são
foram dentro dos móveis para a construção.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Mistress

Ághata. Hoje é só Aghata, mas me lembro de quando eu era pequeno; ela sempre insistia que eu a chamasse de Mistress Ághata. Eu não conseguia. Não conseguia mesmo ou era aquele um sinal premonitório? Sim, porque sempre que eu tentava o “Mistress”, saia-me algo confuso, que lembrava muito “my stress”. Será que eu adivinha que aquela senhora seria mesmo meu estresse?

Mis-tress, ela corrigia. Mis-tress, eu então repetia, com seu acentuado sotaque britânico. Mas, será, My-stress, que eu posso ir dormir na casa do José hoje à noite?

Chegou um momento em que ela desistiu. Eu entendia sim o funcionamento da palavra, suas sibilâncias encaixavam na minha língua, mas o My stress era mais forte que tudo e simplesmente fluía. E como eu estava certo, Mistress Ághata, como eu estava...

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Tempo, Noite, Desquite e Despedida para ela

“Dar um tempo” é coisa na qual eu não acredito. Nem ela. Ou uma relação é sólida o suficiente para se manter às duras próprias pernas ou já nem é mais relação. Como, afastando-se, é possível melhorar um relacionamento? Sim, porque “dar um tempo” além do espaço temporal inclui o espaço físico. O que de perto nem consegue ser amor, de longe é que não vai virar paixão.

Apesar disso, hoje eu a procurei para pedir um tempo. E ela, apaticamente, concordou. Eu quero um tempo porque não tenho, e nunca terei, a hombridade suficiente para deixá-la de todo, apesar dos estragos que ela me tem causado. Ela me sufoca, faz questão de me exigir cada segundo. Ela olha de cara amarrada para meus amigos, estufados de Letras. Ela atrapalha meu sono, invade até meus sonhos, e tem tornado tudo uma imensa confusão. Ela não faz o que peço, some quando mais preciso, cria intrigas indissolúveis, sem que eu nem saiba o porquê.

Chega.

Concordamos que eu virei visitar as crianças de vez em quando, nossos filhos. Além disso vou pagar uma pensão, porque sem isso ela nem vive. Conversas rápidas, flertes ocasionais (se de comum agrado), e alguma hostilidade, desde que amaneirada. Concordamos com tudo isso.

Não pense o senhor que será fácil. Será tudo, menos fácil. Eu sei que juntos já não vivíamos, éramos antes sugados um pelo outro. Há no entanto o fim da comodidade, da dependência, do velho modo. Isso tudo fascina, sim, mas também assusta.

Eu hoje, pelas poucas horas de separação, já me senti levemente perdido, casualmente aéreo. O que fazer sem ela? Ler um livro? Assistir televisão? Tudo me entedia, de repente. Mas não. Eu vou ser mais forte. Meu orgulho sagitariano é ferrenho e não serei eu – jamais – a dar o braço a torcer.

Além disso, agora que chegou a noite com seus convidativos ventos, com seus véus de nuvens acasaladas, seu frescor levemente orvalhado, seus sussuros sensuais em árvores do caminho, eu já me sinto incrivelmente menos só. Vou fazer como a princesa do castelo de Vestal: namorar com a noite e o temporal. De repente eu sou livre e essa liberdade me é boa. De repente eu sou livre e essa liberdade me faz feliz.

De repente eu sou livre, como só em criança fui, e posso ir brincar no balanço, bem sozinho, bem cercado pelo escuro, bem acariciado pelo vento. De repente eu sou, sem ela, completo.

“Well, something is wrong with you
because ever since it's over between you and I
I feel so... amazing!”

É, minha caríssima amante, minha fiel e já não tão boa companheira. Fomos felizes, não fomos? Em algum momento eu lembro que fomos. Mas sua felicidade virtual já não me serve. Já não me completa. Já não me agrada. Eu sinto muito, minha querida Internet, mas está na hora de eu ter o Meu tempo. Como eu disse, eu volto ver nossos filhos, que tanto me orgulham; este aqui, o Anjo, principalmente. Eu volto para manter as coisas nos trilhos. Mas de vez em quando, agora só de vez em quando. Porque minha vida, Internet, fora daqui é mais ainda mais linda.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Heranças genéticas e automóveis pretos, bem bonitos

Como é sabido, fui adotado; o que não me impediu, em absoluto, de herdar as características mais e as menos convenientes de meus pais não-biológicos. Isso mesmo, caros Naturalistas, o Determinismo do meio é mais forte do que o genético.

A aparência eu copiei toda de meu pai, da cor dos cabelos à maneira de andar. Já da minha mãe herdei o pior: o gênio louco e neurastênico, muito embora adocicado pela tranquilidade paterna.

É incrível como reconheço em mim, completo de assombro, as semelhanças inegáveis. Não há defeito que eu não tenha pegado para mim. Não há qualidade, por ínfima que seja, que eu não tenha roubado, seja de um, seja de outro.

No quesito “automóveis”, por exemplo, não conheço ninguém tão perspicaz quanto meu pai. Ele sabe o modelo de todos os carros lançados e ainda não imaginados. E vai além. Seu senso de direção é capaz de achar qualquer caminho em qualquer cidade, mesmo naquelas cheias de ruelas e reentrâncias. noção de espacial é tão apurada que, mesmo no maior estacionamento, ele poderia, de olhos fechados, encontrar o próprio carro. Não bastando, ele ainda conhece alguns segredos da mecânica dessas máquinas, sendo a única coisa que ele é capaz de consertar de forma descente.

Já minha mãe...

— Alô, mãe... Onde vocês estão?

— Voltando.

— Sim, mas aonde?

— Hum... voltando.

Sua resposta incluía qualquer lugar entre o trevo de Passo Fundo e  o de Tapera; aproximadamente 70km. Ela não era capaz de dar nenhum ponto de referência? Não.

— E o pai comprou o carro?

— Comprou sim!

— E que carro é?

— Um preto.

— Sim, mãe... Mas qual a marca?

— Um bem bonito.

Eu gargalhei.

Gargalhei porque minha mãe é assim, simplesmente. E gargalhei porque, no quesito “automóveis” eu sou igualizinho a ela.

E o carro? Ah, o carro é mesmo preto. E bem bonito. : D

E quem me explica esse fascínio pelas loucas mortas?


"distancia. La ternura también puede ser de este azul." (FK)


Parabéns, Friducha.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Ághata vai às compras

Que faço eu de uma Ághata louca? Ela hoje chegou carregada de malas, presentes e sacolas. Conforme ia despejando o conteúdo delas sobre a mesa, eu via surgir o guarda-roupa completo do melhor circo mexicano.

— Mas Ághata, você não comprou roupas, comprou figurinos.

— É lindo, não é?

Não é. Pois é grotesco. Ela se comprou vestidos de tafetá rosa. Xales de tule amarelo. Casacos de pelúcia encarnada. Meias de fios dourados. Lenços insuspeitíssimos de oncinha. Sapatilhas púrpuras de bailarina. Tudo colorido, refulgente, flamejante, regado a miçangas, vidrilhos e contas peroladas.

Não, o gosto de Agatha nunca foi apurado. Ou pelo menos nunca combinou com o meu. Ainda assim, até então ela se vestia de maneira sóbria e elegante. O que brotou de suas sacolas, no entanto, foram roupas de palhaço. Sequer na juventude combinariam com os olhos verdes e os cabelos loiríssimos.

Até para mim ela trouxe um presente. Eu agradeci sorrindo. Mas o que vou fazer de uma calça verde com tantos bolsos quanto há estrelas no céu. Tenho a impressão de que se algo se perder ali, nunca mais será encontrado. Até passagens secretas a calça há de ter.

Ela agora está provando suas roupas. Umas por cima das outras.
E eu, ah, Deus, que faço eu de uma Ághata toda louca e fantasiada?